quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Indivisível.
Inespera.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

quando o encontro acontecer seremos cúmplices
dividirei a dor
secreta


só você
me alivia

a solidão angustia

domingo, 20 de dezembro de 2009

APOCALÍPTICA

Às vezes a esperança falta e desacredito no mundo, nas pessoas e em mim mesma.
A relatividade que há em tudo é uma faca de dois gumes e pode, facilmente, pender para o negativo. Assim, os valores mudam, caem, e as coisas perdem o sentido. Fica difícil colocar o preto no branco e a razão torna-se acinzentada, obscura.
Julgamentos aparentam impossíveis e a injustiça prevalece. Nesses momentos sombrios, parece que o mundo vai acabar... não há solução. E salve-se quem puder, pois não virá ninguém por nós.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Metade de mim é dor,
outra metade, esperança.
Parte de mim impulsiona,
a outra, hesita.
Metade de mim é alada,
outra metade, submersa
Pois parte de mim sonha,
e a outra, morre.
Minha metade silenciosa
tem o pavor de parar,
E minha parte musicada
tem a pressa de partir.
Pois parte de mim anseia
a presença
E uma outra metade ama
a distância.
Metade de mim é solidão,
outra, esquecimento
Pois parte de mim é segredo,
e a outra, passado.
Tenho uma metade que cansou,
e uma outra cheia de saudade.
Então uma parte resiste,
e a outra... voa.
Porque há o amor,
e eu o sou da cabeça aos pés.

sábado, 12 de dezembro de 2009

MENTIRAS SINCERAS

Eu me interesso por tudo o que vejo, dizem, por tudo o que surge desde que pareça sincero. Sou dessas que se adapta fácil a ilusões, doces ou amargas, a qualquer tipo de realidade, desde haja sinceridade.
Tudo o que é sincero tem um alto nível de intensidade, e é assim que julgo o quão importante as coisas são. E, para ser honesta, pouco me importam conceitos como certo ou errado. Levo em conta a verdade profunda. É só isso o que a vida exige.
As coisas só caminham para onde queremos quando somos honestos conosco e com tudo e todos que nos cercam. Tenho provado isso a cada passo que dou. E tenho comprovado, principalmente, que tudo, tudo mesmo, é relativo.
A relativação mantém a dúvida, a novidade, o risco, a surpresa. Que assim sempre seja. Ou não.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

"Dar é dar.
Fazer amor é lindo, é sublime, é encantador, é esplêndido.
Mas dar é bom pra cacete.
Dar é aquela coisa que alguém te puxa os cabelos da nuca...
Te chama de nomes que eu não escreveria...
Não te vira com delicadeza...
Não sente vergonha de ritmos animais. Dar é bom.
Melhor do que dar, só dar por dar.
Dar sem querer casar....
Sem querer apresentar pra mãe...
Sem querer dar o primeiro abraço no Ano Novo.
Dar porque o cara te esquenta a coluna vertebral...
Te amolece o gingado...
Te molha o instinto.
Dar porque a vida é estressante e dar relaxa.
Dar porque se você não der para ele hoje, vai dar amanhã, ou depois de amanhã.
Tem pessoas que você vai acabar dando, não tem jeito.
Dar sem esperar ouvir promessas, sem esperar ouvir carinhos, sem
esperar ouvir futuro.
Dar é bom, na hora.
Durante um mês.
Para os mais desavisados, talvez anos.

Mas dar é dar demais e ficar vazio.
Dar é não ganhar.
É não ganhar um eu te amo baixinho perdido no meio do escuro.
É não ganhar uma mão no ombro quando o caos da cidade parece querer te abduzir.
É não ter alguém pra querer casar, para apresentar pra mãe, pra dar
o primeiro abraço de Ano Novo e pra falar:
"Que que cê acha amor?".
É não ter companhia garantida para viajar.
É não ter para quem ligar quando recebe uma boa notícia.
Dar é não querer dormir encaixadinho...
É não ter alguém para ouvir seus dengos...
Mas dar é inevitável, dê mesmo, dê sempre, dê muito.

Mas dê mais ainda, muito mais do que qualquer coisa, uma chance ao amor.
Esse sim é o maior tesão.
Esse sim relaxa, cura o mau humor, ameniza todas as crises e faz você flutuar

Experimente ser amado"...

Luís Fernando Veríssimo

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

EXPANSÃO

"Estão todos loucos, nesse mundo?
Porque a cabeça da gente é uma
só, e as coisas que há e que
estão para haver são demais de muitas,
muito maiores diferentes,
e a gente tem de necessitar de aumentar
a cabeça
para
o
TOTAL"

[João Guimarães Rosa]

Gostava tanto de ficar perto dele que sua ausência se tornara insuportável, inadmissível, inexplicável, além de injusta. Revoltada, buscara suprir seus abraços em outros braços... Mas nunca conseguiu.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

ABERTURA

- O que será que anda passando por sua cabecinha, hein?
- Ah, por aqui estão passando aquelas quetões da alma, né... Estou me sentindo sozinha, por mais que a amizade não tenha faltado. Uma certa aflição... Veja, minha perna não pára de balançar.
- Isso é a sua ansiedade que saiu do controle novamente. Você é uma pessoa muito ansiosa e não sabe lidar com o que é normal, constante e rotineiro, lembra-se?!
- É verdade... Você havia dito. No entanto minha fase mais intensa e feliz aconteceu numa época em que a rotina fez parte da minha vida, né. Foi bem consistente. Você me fez constatar isso.
- Exatamente. E o que você pensa sobre isso?
- Acho que eu até gosto da rotina, desde que eu esteja completamente conquistada por ela. E acho que é disso que sinto falta: de uma rotina, das coisas em seus lugares.
- Qual rotina seria ideal agora?
- Eu queria acordar bem. Ir para minhas aulas da faculdade dia após dia ciente de que contente ou obrigada, só o tempo me trará o que busco nela. Queria almoçar sempre bem e, pelo menos de vez em quando, ter boa companhia. Depois trabalhar com o fulgor do qual sou acostumada. E, durante todas essas horas, ter meu "coração" feliz por ter em quem pensar e saber, mesmo que sem total certeza, que essa pessoa também pensa em mim. Quando o expediente terminasse, gostaria de nunca ter uma noite a esmo, a não ser quando ela viesse assim. Queria ter pra onde ir durante a noite e não utiliza-la para anoitecer meus sonhos, meus pensamentos e lamentos. Queria ter horários para cuidar do meu corpo... Me sinto tão bem quando ele aparenta assim. E quando chegar em casa, gostaria de ter para quem ligar, caso não me liguassem antes. Alguém para ouvir meus pensamentos e me contar. Ou quando desse, alguém para aparecer à noite aqui em casa e me levar para variar de cama. Acho que só queria alguém para não me deixar sofrer e para cuidar de maneira sinceramente recíproca. Falando nisso, queria planejar felicidade para os finais de semana e não apenas uma maneira de fugir da dor.
- Me parece que você está carente.
- Talvez eu esteja sim. Parece que dependo do outro para ser feliz, não é? E eu sempre odiei qualquer coisa referente à palavra "dependência". Mas eu preciso disso sim e acho que não consigo viver de outra forma que não seja um pouco regada de amor recíproco.
- Então temos um vício comportamental.
- Ok, eu sou viciada em amar. Dizem que o primeiro passo sempre é admitir. Mas isso tem cura? Se abstinência resolvesse, eu não estaria curada?

sábado, 28 de novembro de 2009

Sempre que estou perdida sinto vontade de fugir. Para onde e como, nunca sei.
Mas aprendi que não importa o quão longe eu vá ou o quão próxima eu esteja, em algum momento faltará algo que me permita chegar.
Tenho fugido para vários lados, de diferentes maneiras.... E só tenho desencontrado. No entanto, tenho me divertido assim e isso pode bastar, apesar de não ser uma solução.
Talvez eu seja insolúvel.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

às vezes a solidão machuca quando há uma ponta de carência

veneno para a liberdade,
dependência torpe.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

EMPIRISMO

Desculpe, mas não posso mais.
Nunca fui muito boa em esperas, em especial àquelas que parecem terminar em reticências.
A espera com caráter de vírgula, vá lá. É sempre necessária, uma respiração, breve separação, um tempo justificável que pode mudar o sentido das coisas. - Por falar em pontuação, o ponto final é o mais radical. Depois dele, o que vem é o novo ou o nada. Não há pausas. Ele se basta e o máximo que carrega de esperas é a esperança.
No entanto, a espera-reticências é tão livre que corre o risco de receber diferentes interpretações a cada momento. Ela depende da imaginação, por isso eu não posso mais.
Às vezes confundo intuição com imaginação e acho que posso continuar assim, "reticenciando". Mas imaginar nunca me levou adiante e sempre me foi apenas um meio de despressurização.
Eu imagino sempre, é verdade. Mas a imaginação nunca me convence e do que eu preciso é de acreditar. Eu só sei viver assim, com fé. Creio em meus sentimentos e me guio pela intuição - às vezes deixo as asas rudes do instinto me impulsionarem, apenas pelo prazer de arriscar.
Mas depender da imaginação, me desculpe, não posso mais. Eu confundo tudo e fico com a solidão da dúvida, a mais míope de todas. Sinto muito, mas não posso mais lidar com tamanha obscuridade... Pois eu sinto muito.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

"Cada fração da dor
Agora é chuva
Cai em mim
Mas tudo vai passar
Como tudo passará"

domingo, 22 de novembro de 2009

VOU NESSA

Preciso do que não me deixa em paz
ter o encanto de não andar em vão
viver mais rápido que o destino
e longe do que não sinto.
Eu quero contato com o que é,
com o que arde e não falta.
Sentir por perto o que é inteiro.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

É um tempo em que o ar não é suficiente
O gosto não é o ideal
A sede não é profunda
E a vida parece cansada.

Hoje, nada preenche.
Nem o silêncio,
nem as palavras.

Esperar é acumular ansiedades.

FUTURO DO PRETÉRITO

Não quero mais querer os futuros do pretérito
Mas não posso aceitar esse rude presente
de sonhos do que poderia ser.

Essa ausência presente, aquela presença distante...
a solidão disfarçada que a saudade carrega...

Saudade
de tudo o que não viria.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Pergunte a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunte que horas são e o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio lhe responderão: 'É hora de embriagar-se! Para não ser o escravo mártir do Tempo, embriague-se; embriague-se sem parar! De vinho, de poesia ou de virtude, como quiser'". [Baudelaire]

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

SOBRE DIA, TEMPO, MUDANÇA E QUEDA-LIVRE

Quarta-feira é o dia que divide minha semana ao meio. Une o cansaço inevitável da primeira metade à necessidade de tomar fôlego para o que ainda tem por vir.

Há semanas em que esse dia passa imperceptível, apesar de atropelado. No entanto, nas épocas em que consigo viver as coisas em seu tempo, nesse dia não hesito em tomar o melhor banho, comer o que for mais saboroso, embriagar-me sutilmente de vinho ou qualquer outra dose de alívio, escutar músicas saudosas e ler.

Revistas, quadrinhos, ficção, poesia, filosofia, teoria... um pouco de tudo ou somente tudo de um, até que se esgote em seu último ponto final.
Para mim, a última página é sempre um começo. Pois quando saio do "transe", sou outra.

Talvez por isso também goste de me isolar numa sala de cinema. Apesar de muitos filmes me terem causado revoluções, a leitura me é mais eficiente nesse ponto. Traz mudanças sutis e deixa a revolução por minha conta.

Eu acredito nas mudanças. Para mim, é assim que a vida caminha. Com perdas, ganhos, trocas.

A única coisa que adquirimos pelo caminho é a sabedoria. E essa se alimenta somente quando permitimos que o novo chegue... quando ele nos toca o rosto e tremula os cabelos... ou quando toca frio a espinha, arrepia os pêlos e dá na barriga a sensação de queda-livre.

É isso. Na vida, precisa-se cair livremente.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

às vezes simplesmente não há o que ser descoberto

COMBUSTÃO

Jogatinas, cigarros, álcool, rock'n'roll, cigarrinhos. Foram dias de entrega, de excessos e de liberdade. Parece que subverter a ordem era seu melhor combustível.
Muitos risos chegaram movidos por tudo isso. E ela sabe valorizar uma boa risada, como qualquer um que passou noites na completa escuridão.
Os questionamentos também chegam - como sempre há de acontecer -, mas, mais uma vez, não cabem porquês.
Há lugares para planos de mais momentos como os últimos, de mais risos e combustão. O resto, é só tempo e rotina.

domingo, 8 de novembro de 2009

BASTANTE

Razões eram desnecessárias.
Naquela manhã que começou ao meio-dia - como a maioria de suas manhãs - não pensou em porquês. Nenhuma obrigação lhe esperava com horário marcado, ninguém lhe telefonara e não tinha nada a cumprir. Poderia forçar o sono - tantas vezes perdido durante a semana -, mas levantou-se, pelo simples motivo de mover-se.
E pela vida própria, clareou o lar, escutou música, cozinhou para si, inteirou-se do mundo e tomou cerveja.
Fazia tempo em que as faltas eram ausentes. E não há sensação mais livre do que a do bastante.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

(IN)SEGURANÇA

"Porque se chamava moço
Também se chamava estrada
Viagem de ventania
Nem lembra se olhou pra trás
Ao primeiro passo"

De repente, quando resolvemos perceber, as amarras já foram feitas. Quando olhamos no espelho, já estamos presos, limitados, quase incapazes. Mais do que não nos arriscar, passamos a temer os movimentos. Fomos dominados pela insegurança e pelo obscuro.
No entanto, a vida é completamente insegura e feita de riscos. E não há o que seja dotado de uma segurança real para nós.
A segurança é algo que se tem. Que se constrói dentro de si. É algo individual.
Só se pode ser um exuberante trapezista na vida enquanto se está seguro de si mesmo.

IMAGEM

Ao abrir a bolsa pela manhã encontrou um copo. E sorriu com a surpresa da lembrança ainda úmida, turva, etílica... Secreta. Depois, retirou porta-copos, balas, até chegar no antes. Eram infinitas anotações em bloquinhos, flyers e canetas perdidas. Recordações do dia, do expediente, do suor, também aparecem.

Pode-se sair o que imaginar de uma bolsa de mulher. E das lembranças, recordações, o que mais sai é imaginação.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

NUDE

Queria despir- se de qualquer moral...
significâncias, relevâncias
das cores e máscaras
que cobrem os desejos
e muitos medos

Queria curar a miopia
que torna pálida e disforme
a realidade da alma...

Queria recolher-se a si
Sem verdades ou enganos
na liberdade
individualizada

Queria transcender
às tonalidades, às nuances,
e aos desencantos
dos julgamentos.

Ela foi.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

OUTRAS PALAVRAS

mútuo?

mutação

mútua,
ou não.

talvez o vento não erre direções...
são relativos, caminhos e erros
o vento, não

relativação

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

DILACERA


Talvez fosse uma mulher agora. Seus desejos tem sido tão dilacerantes quanto todo seu resto. É uma época sangrenta. E talvez mulher tenha nascido pra isso. Para sangrar.
Não há cor mais feminina; mais ferida aberta. Dor e força, uma paixão melancólica. O tom rubro é da espera sem fim. Pois é uma resistência renitente, insistente... É crente. Mulher é assim mesmo em sua natureza. Está em contato direto com as entranhas.
Vermelho é ela pelo avesso. Por isso talvez seja mulher agora. A cor pinta a necessidade de par, de paralisação. Total redenção. Pede-se acolhimento, salvação; clama por início.
É urgente estancar e cessar tudo o que for rubro. Não deixar coágulos.
Por isso o vinho, por isso o sangue, por isso o vermelho. Por isso a mulher e o coração.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

INFINITAMENTE PESSOAL

Hoje, não...

Me falta canção

Sentir o silêncio

Hoje, eu parei


um lugar sem fundo

uma saudade
daquele mundo

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

"O amor
é uma ave a tremer
nas mãos de uma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz."

[Eugénio de Andrade]

"- Diz-me uma coisa, compadre: porque lutas?
- Porque tem de ser, compadre - respondeu o coronel Gerineldo Márquez. - Pelo grande Partido Liberal.
- Que sorte tens em sabê-lo - respondeu ele. - Eu, pela parte que me toca, só agora me apercebo que luto por orgulho.
- Isso é mau - disse o coronel Gerineldo Márquez.
O coronel Aureliano Buendía ficou divertido com o seu sobressalto. "Naturalmente", disse. "Mas em todo o caso é melhor isso do que não saber por que se luta." Olhou-o nos olhos e acrescentou a sorrir:
- Ou lutar como tu, por uma coisa que não significa nada para ninguém".

[Gabriel García Márquez, Cem Anos de Solidão]

Minha maior mania
é acreditar num outro dia

TRASIÇÃO

Volto sim,
um dia, eu volto
Mas parto
pra sempre
E fico...
se não é hora ainda.
Eu continuo
pois sou duradoura

Ajuda não se recusa.
Nunca se sabe quando pode-se precisar dela.

REFÉM

Fuga de mim.
Não importa quantas vezes eu parta
quantas vezes eu esqueça...
As dores,
os medos continuam os mesmos.
Existem, como existo.
Em certos momentos não se pode escolher.
Me torno refém...
Por algum motivo, a vida precisa ser preservada.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

"Lobos? São muitos.
Mas tu podes ainda
a palavra na língua
aquietá-los.

Mortos? O mundo.
Mas podes acordá-lo
sortilégio de vida
na palavra escrita.

Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
se à lucidez dos poucos
te juntares.

Raros? Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro
se nas coisas que digo
acreditares.”

[Poema sem título de Hilda Hist]

"- O que é que você quer?
- Não quero nada, respondi. Quero o que as coisas quiserem.
- Ninguém pode passar sem querer. Está com medo de querer o quê?"

[Trecho do conto Daruma Arigatô, de Paulo Leminski]

sábado, 10 de outubro de 2009

BORBOLETAR

"Eu quero dizer
Agora, o oposto do que eu disse antes
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo"

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

OUSADIA É A PALAVRA

Não existe verdade absoluta. A revolução vem de baixo. Não há como ser diferente. Ascende das entranhas, das raízes mais profundas. É assim na história, porque é assim na gente. Tudo no mundo se corresponde e o óbvio sempre é o mais difícil de enxergar.

Acontecimentos se interligam em todos os níveis e não é preciso compreendê-los. Basta sentí-los, acompanhar o fluxo, caminhar em harmonia.

Negar a correnteza requer esforço. Nadar no sentido contrário, cansa. Exercita, mas é errante. Por isso, a pena vale o aprendizado, mas toma tempo e sempre acaba na margem enquanto a vida do rio corre.

No entanto, o ciclo é assim mesmo. A gente erra, insiste, se cansa e vai parar na margem. Para isso as margens - que são tantas - servem: Para nos ensinar sobre o fluxo; para aprendermos a fluir.

Eu não tenho fluído. Tenho tentado demais, errado demais, insistido demais. Me cansei demais. Perdi muitas águas e, principalmente, seu tempo. Fiz mar de água doce. Foi forte, divertido, e me perdi.

Mesmo sabendo que me perderei sempre e sempre e de novo, é bom descansar. É ótimo saber que meu rumo está bem aqui, tocando os meus pés. E, conforme o fôlego volta, me deixo fluir.

Uma revolução está por vir em mim. E essa, de tão profunda, ouso dizer que trará uma nova era, tempos duradouros. Até que a verdade caia novamente.

OUSADIA. É isso que sinto conspirar quando intensiono dar meu primeiro passo. Não importa se racionalmente parece contraditório, mas a maior segurança que sinto, intuo, vem da ousadia. Isso é fluir.


sexta-feira, 18 de setembro de 2009

"Eu preciso ouvir, você não precisa falar, nos amamos desinformados".
[Fabrício Carpinejar]

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

ÀS RISCAS

"Não quero medir a altura do tombo", jamais. Mas a grande emoção em andar na corda bamba surge quando o nível do perigo é superado.
Pode haver o infinito lá embaixo; a emoção já não vem do risco de cair, está no risco de manter-se sobre a corda, passo a passo tênue, a cada triz.

A placidez não se faz do ultrapasso do limite, mas de atingi-lo.


terça-feira, 15 de setembro de 2009

"Eu ainda era noite
e já sonhava madrugadas
Eu ainda era inverno
e já sonhava primaveras
Eu ainda era botão
e já sonhava flores.

Este todo o meu drama!

E se eu me perdi
porque de mim me parti
à procura de mais-além

de que vale então viver
se indo com os outros me atraso
se buscando ir mais além me perco?"

[Poema Labirinto, do caboverdiano Ovídio Martins]

PASSAR

"Não quero ficar parado dando adeus,
as coisas passando.
Eu quero é passar com elas
e não deixar nada mais do que as cinzas de um cigarro
e a marca de um abraço no seu corpo.
Não, não sou eu quem vai ficar no porto chorando,
lamentando o eterno movimento dos barcos."

[Trecho da canção Movimento dos Barcos, de Jards Macalé e Capinam]

sábado, 12 de setembro de 2009

PORTAS

Não sei quantas. Mas preciso chegar a cada uma. Destrancar, abrir, libertar.
Descobrir entradas e saídas.
Realizar passagens, enfim.
Tudo vale a pena. Tem de valer.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A ESMO

O constante conflito das profundezas apavora a fluidez das ondas. Transforma a livre impulsão deste mar de emoções. Ele, que se renova entre cada chegada ao sol e retorno à imensidão, está em tempestade. Nesta tormenta, a única clareza é que os elementos estão desordenados sem harmonia.
Carregado de desequilíbrio, o mar lança as ondas sobre pedras, com insistente violência, e, de maré alta, alcança o que não deve. Por vezes, recua de repente. Outrora, ameaça um tsunami. Mesmo sob o sol forte de brilhantes dias, ou diante do frescor da manhã que surge, ou ainda com o espetáculo da noite que cái por trás, a tormenta não cessa.
No meu mar de emoções, as ondas correm a esmo. E isso acaba com os sentidos de quem escolheu viver "como uma onda no mar".

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Recordar: Do latim re-cordis, voltar a passar pelo coração.
[Eduardo Galeano]

terça-feira, 8 de setembro de 2009

"O mundo das paixões é o mundo do desequilíbrio, é contra ele que devemos esticar o arame das nossas cercas, e com as farpas de tantas fiadas tecer um crivo estreito, e sobre este crivo emaranhar uma sebe viva, cerrada e pujante, que divida e proteja a luz calma e clara da nossa casa, que cubra e esconda dos nossos olhos as trevas que ardem do outro lado; e nenhum entre nós há de transgredir esta divisa, nenhum entre nós há de estender sobre ela sequer a vista, nenhum entre nós há de cair jamais na fervura desta caldeira insana, onde uma química frívola tenta dissolver e recriar o tempo; não se profana impunemente ao tempo a substância que só ele pode empregar nas transformações, não lança contra ele o desafio quem não receba de volta o golpe implacável do seu castigo; ai daquele que brinca com fogo: terá as mãos cheias de cinza; ai daquele que se deixa arrastar pelo calor de tanta chama: terá a insônia como estigma; ai daquele que deita as costas nas achas desta lenha escusa: há de purgar todos os dias; ai daquele que cair e nessa queda se largar: há de arder em carne viva; ai daquele que queima a garganta com tanto grito: será escutado por seus gemidos; ai daquele que se antecipa no processo das mudanças: terá as mãos cheias de sangue; ai daquele, mais lascivo, que tudo quer ver e sentir de um modo intenso: terá as mãos cheias de gesso, ou pó de osso, de um branco frio, ou quem sabe sepulcral, mas sempre a negação de tanta intensidade e tantas cores: acaba por nada ver, de tanto que quer ver; acaba por nada sentir, de tanto que quer sentir; acaba por só expiar, de tanto que quer viver; cuidem-se os apaixonados, afastando dos olhos a poeira ruiva que lhes turva a vista, arrancando dos ouvidos os escaravelhos que provocam turbilhões confusos, expurgando do humor das glândulas o visgo peçonhento e maldito; erguer uma cerca ou guardar simplesmente o corpo, são esses os artifícios que devemos usar para impedir que as trevas de um lado invadam e contaminem a luz do outro, afinal, que força tem o redemoinho que varre o chão e rodopia doidamente e ronda a casa feito fantasma, se não expomos nossos olhos à sua poeira? é através do recolhimento que escapamos ao perigo das paixões, mas ninguém no seu entendimento há de achar que devamos sempre cruzar os braços, pois em terras ociosas é que viceja a erva daninha".


[Raduan Nassar, Lavoura arcaica]

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

"Enquanto dura o baixo astral, perco tudo. As coisas caem dos meus bolsos e da minha memória: perco chaves, canetas, dinheiro, documentos, nomes, caras, palavras. Eu não sei se será mau-olhado.
Pura casualidade, mas às vezes a depressão demora em ir embora e eu ando de perda em perda, perco o que encontro, não encontro o que eu busco, e sinto medo que numa dessas distrações, acabe deixando a vida cair".

[Eduardo Galeano, O Baixo Astral, em O Livro dos Abraços]

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

"Assovia o vento dentro de mim. Estou despido. Dono de nada,
dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou
minha cara contra o vento, a contravento, e sou o vento que bate
em minha cara."


"Tem gente de fogos grandes e fogos pequenos e fogos de todas as cores. Tem gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de faíscas; alguns fogos, fogos bobos, não iluminam nem queimam, mas outros ardem a vida com tanta vontade, que não se pode vê-los sem piscar, e quem se aproxima se incendeia."

[Eduardo Galeano]

A ESSÊNCIA DA POESIA

"Não aprendi nos livros qualquer receita para a composição de um poema; e não deixarei impresso, por meu turno, nem sequer um conselho, modo ou estilo para que os novos poetas recebam de mim alguma gota de suposta sabedoria. Se narrei neste discurso alguns sucessos do passado, se revivi um nunca esquecido relato nesta ocasião e neste lugar tão diferentes do sucedido, é porque durante a minha vida encontrei sempre em alguma parte a asseveração necessária, a fórmula que me aguardava, não para se endurecer nas minhas palavras, mas para me explicar a mim próprio.
Encontrei, naquela longa jornada, as doses necessárias para a formação do poema. Ali me foram dadas as contribuições da terra e da alma. E penso que a poesia é uma ação passageira ou solene em que entram em doses medidas a solidão e solidariedade, o sentimento e a ação, a intimidade da própria pessoa, a intimidade do homem e a revelação secreta da Natureza. E penso com não menor fé que tudo se apoia - o homem e a sua sombra, o homem e a sua atitude, o homem e a sua poesia - numa comunidade cada vez mais extensa, num exercício que integrará para sempre em nós a realidade e os sonhos, pois assim os une e confunde.
E digo igualmente que não sei, depois de tantos anos, se aquelas lições que recebi ao cruzar um rio vertiginoso, ao dançar em torno do crânio de uma vaca, ao banhar os pés na água purificadora das mais elevadas regiões, digo que não sei se aquilo saía de mim mesmo para se comunicar depois a muitos outros seres ou era a mensagem que os outros homens me enviavam como exigência ou embrazamento. Não sei se aquilo o vivi ou escrevi, não sei se foram verdade ou poesia, transição ou eternidade, os versos que experimentei naquele momento, as experiências que cantei mais tarde.
De tudo aquilo, amigos, surge um ensinamento que o poeta deve aprender dos outros homens. Não há solidão inexpugnável. Todos os caminhos conduzem ao mesmo ponto: à comunicação do que somos. E é necessário atravessar a solidão e aspereza, a incomunicação e o silêncio para chegar ao recinto mágico em que podemos dançar com hesitação ou cantar com melancolia, mas nessa dança ou nessa canção acham-se consumados os mais antigos ritos da consciência; da consciência de serem homens e de acreditarem num destino comum".

[Pablo Neruda, em "Nasci para Nascer" (Discurso na entrega do Prémio Nobel)]

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

LADO ESQUERDO

Proclamação: Estou, definitivamente (até que a definição mude), ao lado esquerdo. E solta, solta demais, apesar do aperto.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

MESMO CICLO

;vivo num ciclo. volto sempre aos mesmos erros. não sei como escapar. nem tudo dá pra recomeçar.
como expandi- lo? nunca encontrei respostas. só a ilusão de ter respondido. sempre me perco no mesmo cruzamento. faço o retorno. chego ao mesmo beco sem saída aparente. meu único trunfo é saber que há saída. a certeza impede a queda. a certeza não evita o desespero.
me aventuro na roda gigante, a qual finjo ser montanha russa...

Aconteceu como chegam os crepúsculos: Uma leve brisa de outono que, intensa na sua sutileza, arrepia a nuca e provoca um suspiro profundo. Nele, sente-se o cheiro de eternidade, por mais que a naturalidade das cores anuncie a noite e o frio; mesmo que os pássaros partam como fugindo do fim.
Acontece a cada momento realizado, sempre eterno.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

NOITE DE DRUMMOND

"Acordar, viver

Como acordar sem sofrimento?
Recomeçar sem horror?
O sono transportou-me
àquele reino onde não existe vida
e eu quedo inerte sem paixão.

Como repetir, dia seguinte após dia seguinte,
a fábula inconclusa,
suportar a semelhança das coisas ásperas
de amanhã com as coisas ásperas de hoje?

Como proteger-me das feridas
que rasga em mim o acontecimento,
qualquer acontecimento
que lembra a Terra e sua púrpura
demente?
E mais aquela ferida que me inflijo
a cada hora, algoz
do inocente que não sou?

Ninguém responde, a vida é pétrea."



"A hora do cansaço

As coisas que amamos,
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade.

Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.

Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nós cansamos, por um outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.

Do sonho de eterno fica esse gosto ocre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar."

"OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação."


"Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.

Ouvindo-te dizer: Eu te amo,
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?

Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois ao não dizer: Eu te amo,
desmentes
apagas
teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.
Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor
saltando da língua nacional,
amor
feito som
vibração espacial.

No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de amar-me,
que nunca me amastes antes.

Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor."



"Desejo

Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.

Desejo, pois, que não seja assim
Mas se for, saiba ser sem se desesperar
Desejo também que tenha amigos
Que mesmo maus e inconseqüentes
Sejam corajosos e fiéis
E que pelo menos em um deles
Você possa confiar sem duvidar

E porque a vida é assim
Desejo ainda que você tenha inimigos
Nem muitos, nem poucos
Mas na medida exata para que
Algumas vezes você se interpele
A respeito de suas próprias certezas.
E que entre eles
Haja pelo menos um que seja justo

Desejo depois, que você seja útil
Mas não insubstituível
E que nos maus momentos
Quando não restar mais nada
Essa utilidade seja suficiente
Para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante
Não com os que erram pouco
Porque isso é fácil
Mas com os que erram muito e irremediavelmente
E que fazendo bom uso dessa tolerância
Você sirva de exemplo aos outros

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais
E que sendo maduro
Não insista em rejuvenescer
E que sendo velho
Não se dedique ao desespero
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor

Desejo, por sinal, que você seja triste
Não o ano todo, mas apenas um dia
Mas que nesse dia
Descubra que o riso diário é bom
O riso habitual é insosso
E o riso constante é insano.

Desejo que você descubra
Com o máximo de urgência
Acima e a respeito de tudo
Que existem oprimidos, injustiçados e infelizes
E que estão bem à sua volta
Desejo ainda
Que você afague um gato, alimente um cuco
E ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque assim, você se sentirá bem por nada

Desejo também
Que você plante uma semente, por menor que seja
E acompanhe o seu crescimento
Para que você saiba
De quantas muitas vidas é feita uma árvore

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro
Porque é preciso ser prático
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele na sua frente e diga:
"Isso é meu"
Só para que fique bem claro
Quem é o dono de quem

Desejo também
Que nenhum de seus afetos morra
Por eles e por você
Mas que se morrer
Você possa chorar sem se lamentar
E sofrer sem se culpar

Desejo por fim
Que você sendo homem, tenha uma boa mulher
E que sendo mulher, tenha um bom homem
Que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes
E quando estiverem exaustos e sorridentes
Ainda haja amor pra recomeçar

E se tudo isso acontecer
Não tenho mais nada a lhe desejar"



[Victor Hugo]

sábado, 15 de agosto de 2009

Que este tempo seco não acabe com a liquidez das emoções, a lubrificação das lembranças, a intensidade das ondas da mudança, a velocidade da correnteza que me leva, por mais que por vezes eu nade contra. Que o tempo não seque minha coragem de acreditar.

Diálogo

"— E você, por que desvia o olhar?

(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarrá-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)

— Ah. Porque eu sou tímida."

[Apoena]

domingo, 2 de agosto de 2009

"O quereres e o estares sempre a fim do que em mim é de mim tão
desigual

Faz-me querer-te bem, querer-te mal, bem a ti, mal ao quereres
assim

Infinitivamente pessoal, e eu querendo querer-te sem ter fim

E querendo te aprender o total do querer que há e do que não há
em mim"

[Chico e Caetano]

quinta-feira, 23 de julho de 2009

CONQUISTAS E REVOLUÇÕES

Me disseram: - Nossa, você vive mudando.
É verdade. Não me contenho quando algo não me faz mais mover, quando não me cativa o suficiente ou se torna indiferente. Preciso ser conquistada, constantemente.
Em mim, não existe o que "vem, fica e vai ficando"; existe sim o que "vem, fica, e fica, e fica e, mais uma vez, fica", sem parar. Assim como há o que vem e passa... como vendaval ou brisa.
A maioria das conquistas que sofri foram recíprocas - e também as que protagonizei. Acho que elas acontecem simultaneamente. É o movimento. E este, quando cessa, acaba com qualquer possibilidade de continuação.
Estagnação não tem energia, é ponto morto e nada a perder. Acho triste. Mas, quando ocorre, eu quase sempre insisto, tento injetar ânimo - se o tenho - e encaro.
Eu ENCARO. Por mais que adie. Então, eu mudo. Com ou sem remorso.
No entanto, minha mudança não é só reação. Na maioria das vezes, é ação. Pois é, também, minha maneira de fugir de estar parada. É meu modo de reconquistar a vida. De recomeçar a felicidade e alcançar novas emoções. De gerar possibilidades.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

SOB LIBERDADE

Chegou o momento de fazer o que se deve em detrimento, muitas vezes, do que de fato se quer fazer. Tudo para alcançar um desejo maior, que justificaria todas as renúncias.

É preciso sabedoria e coragem. Uma, para conseguir balancear a rotina e as urgências. Outra, para seguir o caminho sem cair. E é imprescindível o prazer para, no fim da labuta, reconhecer que tudo valeu a pena.

Penar é inevitável, conforme a elevação do objetivo e na medida em que o alcance se aproxima. Aceitar as penas é o primeiro passo para deixa-las mais leves.
Me convenço que se acredito que algo é possível, realmente é. Caso depois não seja, a culpa é minha.

Por isso, creio na liberdade e, ainda mais, na capacidade de nos libertarmos. A liberdade é, antes de tudo, a renúncia.

Grandes metas exigem difíceis renúncias. Assim, quanto mais se alcança, a menos se está preso.

Há chegado o tempo de libertar.

domingo, 12 de julho de 2009

Mon Amour



"Mon amour
Mon amour, mon amour, mon amour

Buy me the moon and bring all the stars together
Inside my room the world is a spaceship to somewhere
I don't know, I don't care
As long as I go on dancing... with Fred Astaire

Kiss me I'm sweet no matter how bitter life is
Down in the street I look for a never ending love
Maybe pearls
Could steal any girl's... dream
I get high, me and my big mind
I get down, down, yeah
Me and my little money, honey

Drink and dance and laugh and lie
Love the reeling midnight through
For tomorrow we way die but today...
We never do"

[Rita Lee]

A VIDA COMO FILME

"A vida é como um filme". Acabo de ouvir essa frase, a primera do filme que começou na TV. Me chamou a atenção pois, por várias vezes, pensei parecido . Em situações corriqueiras, me imaginei num filme, tragicômico, a maioria das vezes. Por exemplo, quando estava encrencada com o lead de uma matéria. Minha editora disse que deveria entregá-la em 40 minutos. Neste momento, imaginei uma câmera se aproximando e, num close fechado, se veria meus dentes cerrados, talvez uma gota de suor escorrendo - se não fosse o gelado ar-condionado da redação -, meus olhos olhando de um lado para o outro e, em seguida, meu pensamento "diria", em off: to ferrada.
Na verdade, além de "to ferrada", pensei que não conseguiria terminar no dead line estipulado, Assim que os 40 minutos passassem, teria que pedir, na cara de pau, mais meia hora. Também cogitei a possibilidade de ser acometida por uma habilidade surpresa. Superaria as espectativas.
Num filme não haveria escolha, e, como trata-se de uma personagem desesperada de tragédias cômicas, 30 segundos depois, a pretensa repórter teria sido atropelada pelos 40 minutos e por uma bronca da chefe. No entanto, na vida há possibilidades, inclusive, de mudar o gênero da trama.
"A vida é como uma história que a gente escreve. Eu não quero ser atriz, quero ser a personagem", disseram no filme. Estranhamente, a vida é menos óbvia que os filmes... Acho que é questão de continuidade. O tempo cinematográfico ultrapassa a velocidade dos acontecimentos. Na vida, não se pode pular acontecimentos, feitos de minuciosidades.
Aquela minha situação terminou de nenhuma maneira avassaladora. A chefe teve uma reunião no momento e acabei recebendo 20 minutos extras para terminar. São as casualidades da vida, onde revesamos com o destino a função de diretor e de roteirista. No caso, dirigi a situação que o destino escreveu. Em casos como quando prometemos começar uma dieta no dia seguinte, se no próximo set lá estivermos nós nos empanturrando de chocolate, a culpa será de nosso roteiro.
Há também os momentos de improviso, onde não há roteiro nem direção e toda a cena depende da habilidade do progonista. E esses momentos, talvez os mais marcantes da vida, jamais caberão na obviedade dos filmes.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Do Desejo

"Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer."
[Hilda Hilst]

domingo, 28 de junho de 2009

NEW WAVE

Eu gosto mesmo é do novo e, principalmente, do momento em que ele acontece. Definitivamente, a maioria das coisas em minha vida acontecem quando tem de acontecer. Às vezes, chegam meio atrasadas, só pra eu aprender a esperar e para testar e ampliar meus limites. Outras vezes, chegam adiantadas e me pegam de surpresa, me lembrando de que não sou tão dona assim de meu tempo.

Coisas novas mudam a rotina, balançam as estruturas, tiram tudo do lugar. Desarrumam cada espaço e te fazem estar em constante busca por uma melhor organização de si mesmo. Apontam a desnecessidade de coisas até então fundamentais, assim como evidenciam o quão despreocupado você tem sido com alguns pontos de sua vida.

Iniciar é sempre bom e é a melhor parte de qualquer coisa que aconteça. É aprendizado e inovação... Sob coragem.

"Centímetros
sentimentos mínimos"
P.L

"A POESIA É UM INUTENCÍLIO"
Paulo Leminski

domingo, 21 de junho de 2009

SEM CONVENÇÕES

Sabe, aprendi a apreciar a solidão dentro de casa. Poder cogitar um banho à meia noite de sábado, por pura falta do que fazer, por nada querer fazer e nada convir. Isso permite a anarquia da vida privada.

Tão bom no começo da madrugada fazer uma seleção de músicas no playlist, levar o laptop pro banheiro e escolher aleatoriamente a música "The Show Must Go On" do Pink Floyd para começar. Depois, correr pro chuveiro com uma latinha de cerveja. Melhor que isso, só quando o banho for de banheira.

Logo após o banho, ainda mal enxuta, acender um cigarro, fino igual a um palito de fósforo, e abrir um livro ou uma revista. Quando cansar, colocar o pijama e assistir a um filme daquele que fica na prateleira meses esperando uma chance de ser visto. Então, no fim, quem sabe, dormir.

O QUE DÓI ÀS AVES


Essa história de sair voando de lugar em lugar vem de uma natureza meio dolorida, melancólica, visceral e selvagem. Às vezes ocorre às aves não mais levantar voo- ao menos não longíquos- já que um bom terreno foi encontrado, daqueles de viver confortavelmente. Onde poderiam criar planos de raízes profundas e construir sonhos sólidos do tamanho que eles fossem. Mas aves não nasceram para terrenos.

Esses alados nasceram para alto de árvores, variáveis de tempos em tempos; Para viver em busca do clima ideal, em corriqueiras migrações. Não têm sua natureza feita para apegos, para horizonte limitado. Mas, ainda assim, se apegam.

O que dói às aves é querer ficar de vez em quando, mas sempre ter que partir, conforme rege sua natureza. Nega-la seria não viver, se trair, perder o canto e o encanto. Já partir, é uma constante dor, mas, de tanto ser inevitada, é necessária para que possa haver o canto.

Foto: Marina Bártholo

quinta-feira, 18 de junho de 2009

SONHANDO FRIO


Um misto de emoções certeiras e solidões costumeiras batido no liquidificador do dia a dia formou uma massa de densas manias compulsivas. De repente, uma personalidade nada homogênea e de cor duvidosa transitava pela rotina vaga do existir e não pensar, não saber e ser.
Certo dia anoiteceu, a terra tremeu. Então amanheceu e the dream is over.

Foto: Marina Bártholo

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Não consegui desfazer a mala.
Acho que não voltei...
Sou par t ida

domingo, 14 de junho de 2009

"Tranquilamente
Como adormece a noite pelo Outono"


Foto: Marina Bártholo

sábado, 6 de junho de 2009

"Escolha"

"Eu te amo como um colibri resistente
incansável beija-flor que sou
batedora renitente de asas
viciada no mel que me dás depois que atravesso o deserto.
Pingas na minha boca umas gotas poucas
do que nem é uma vacina.
Eu uma mulher, uma ave, uma menina…
Assim chacinas o meu tempo de eremita:
quebras a bengala onde me apoiei, rasgas minhas meias
as que vestiram meus pés
quando caminhei as areias.

Eu te amo como quem esquece tudo
diante de um beijo:
as inúmeras horas desbeijadas
os terríveis desabraços
os dolorosos desencaixes
que meu corpo sofreu longe do seu.
Elejo sempre o encontro
Ele é o ponto do crochê.
Penélope invertida
nada começo de novo
nada desmancho
nada volto

Teço um novo tecido de amor eterno
a cada olhar seu de afeto
não ligo para nada que doeu.
Só para o que deixou de doer tenho olhos.
Cega do infortúnio
pesco os peixes dos nossos encaixes
pesco as gozadas
as confissões de amor
as palavras fundas de prazer
as esculturas astecas que nos fixam
na história dos dias

Eu te amo.
De todos os nossos montes
fico com as encostas
De todas as nossas indagações
fico com as respostas
De todas as nossas destilairias
fico com as alegrias
De todos os nossos natais
fico com as bonecas
De todos os nossos cardumes
as moquecas."
[Elisa Lucinda]

"CREDO"

"De tal modo é, que eu jamais negá-lo poderia:

sou agarrada na saia da poesia!
Para dar um passeio que seja, uma viagem de carro, avião ou trem, à montanha, à praia, ao campo, uma ida a um consultório com qualquer possibilidade, ínfima que seja, de espera, passo logo a mão nela pra sair.
É um Quintana, uma Adélia, uma Cecília, um Pessoa
ou qualquer outro a quem eu ame me unir.
Porque sou humano e creio no divino da palavra, pra mim é um oráculo a poesia!
É meu tarô, meu baralho, meu tricot,meu i ching, meu dicionário, meu cristal clarividente, meus búzios, meu copo d'água, meu conselho, meu colo de avô, a explicação ambulante para tudo o que pulsa e arde.
A poesia é síntese filosófica, fonte de sabedoria, e bíblia dos que, como eu, crêem na eternidade do verbo, na ressurreição da tarde e na vida bela.
Amém!"

[Elisa Lucinda]

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A felicidade não é o contentamento.
É, antes, o descontentamento,
o eterno movimento para conter
o incontentável

É não conseguir,
e, sobretudo,
querer buscar.

Nada é mais triste
que a vida nula
em que nada cresce,
começa ou
continua.
Somente termina.

Nada rima com sempre
Já o agora rima
com ir embora
e com demora

Uns precisam falar para calar o que grita por dentro,
Outros precisam calar para falar o que grita por dentro;
A renúncia é sublime, não tem patamar.

É que hoje eu tenho mais poesia
Hoje, eu sou feliz todo dia

ESSA UMA VEZ

Uma vez, eu morei pertinho do aeroporto. À noite, eu deitada no escuro, via pela janela um avião passar. Enxergava luzes e rodinhas, prontas pra rodar. Fazia tanto, tanto barulho aquele que chegava... Incrível, mas dava medo ver algo tão grande, que esteve tão alto, vir pousar por perto.
Depois do silencio, eu dormia.

Essa manhã, na penumbra, eu vi pela fresta da cortina um passáro passando... Indo e voltando. Era tão silencioso aquele bater de asas! Incrível, mas me senti convidada: - Não fique aí travada!
Depois do canto, eu levantei.

terça-feira, 2 de junho de 2009

CREPUSCULAR

CREPUSCULAR é a bela melancolia
não é alegre
não é triste

é o nulo colorido
de cores inesperadas
na eternidade natural

o raio que penetra
o bréu
o bréu que anoitece
o sol

um matiz constante
de nuances macro

é sutileza
segredo
silêncio
pássaro voando

é passageiro...
sempre volta
às vezes falta

é provável
imprevisível
e admirável

só admirável

em seu completo
e inútil
mistério

Lá pro meio de maio, início de junho, é a época que você diz em que Brasília fica mais bonita. Pois, nesses tempos, o céu da cidade tem menos nuvens e proporciona os mais belos crepúsculos.
É dessa época, de belos fins de tarde, o nosso amor crepuscular.

domingo, 31 de maio de 2009

"Aprendi a ser como a primavera, a me deixar cortar para voltar sempre inteira"
[Clarice Lispector]

sexta-feira, 29 de maio de 2009

IMPULSIVIDADE VICE-VERSA

o impulso
impulsiona
o pulo
acomete
o pulso
liberta
o silencio
ilumina
a alma
voa
as asas
impulsivamente