terça-feira, 23 de março de 2010

Dia após dia e um desejo incessante de libertar-me
sem saber do que
mas nas noites eu me livro
e nada mais exige por quê

segunda-feira, 22 de março de 2010

DESASSOSSEGO

" (...) inquietação que nos torna insuportavelmente exigentes com a gente mesmo e a ambição de vencer não os jogos, mas o tempo, este adversário implacável.
Desassossegados do mundo correm atrás da felicidade possível, e uma vez alcançado seu quinhão, não sossegam: saem atrás da felicidade improvável, aquela que se promete constante, aquela que ninguém nunca viu, e por isso sua raridade.
Desassossegados amam com atropelo, cultivam fantasias irreais de amores sublimes, fartos e eternos, são sabidamente apressados, cheios de ânsias e desejos, amam muito mais do que necessitam e recebem menos amor do que planejavam.
Desassossegados pensam acordados e dormindo, pensam falando e escutando, pensam ao concordar e, quando discordam, pensam que pensam melhor, e pensam com clareza uns dias e com a mente turva em outros, e pensam tanto que pensam que descansam.
(...)
Desassossegados vestem-se de qualquer jeito, arrancam a pele dos dedos com os dentes, homens e mulheres soterrados, cavando uma abertura, tentando abrir uma janela emperrada, inventando uns desafios diferentes para sentir sua vida empurrada, desassossegados voltados pra frente.
Desassossegados desconfiam de si mesmos, se acusam e se defendem, contradizem-se, são fáceis e difíceis, acatam e desrespeitam as leis e seus próprios conceitos, tumultuados e irresistíveis seres que latejam.
Desassossegados têm insônia e são gentis, lhes incomodam as verdades imutáveis, riem quando bebem, não enjoam, mas ficam tontos com tanta idéia solta, com tamanha esquizofrenia, não se acomodam em rede, leito, lamentam a falta que faz uma paz inconsciente.
Desta raça somos todos, eu sou, só sossego quando me aceito".
[Martha Medeiros]

terça-feira, 16 de março de 2010

FLASHS

Vícios, velocidade, Agora. Viver a 300 km/h.

A estrada nunca é reta, por isso não há tédio. Mas há de se ter cuidado, muito, para não entrar rápido demais no que requer precaução, apurada atenção.

No mais é preciso saber a hora de reduzir, mesmo que a pista esteja favorável, para olhar ao redor, admirar, absorver, se encantar com os detalhes.

Outras vezes é imprescindível parar, apagar. Abastecer de seu combustível primordial. Sentir a terra, se reconstituir. Assim, seguir viagem com vigor.

Porque a velocidade e os vícios nunca podem ser ao extremo por muito tempo. Não acaba bem. E o Agora... ora, não há nada mais eterno do que isso. Só importa que ele passe da melhor forma possível, independente.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Eu, quando triste, me entrego. Toda. De corpo, alma, lágrimas e soluços. Faço cena.
Ligo um blues, bebo vinho, me contorço. Desarrumo a cama, mancho o travesseiro. Apago a luz e sento no chão, gelado.
Depois, eu encaro no espelho a face inchada. Vejo os olhos vermelhos, efeitos da alma lavada - tudo passa.
Acendo meu cigarro, esvazio a mente e sorrio. Sou feliz novamente e ninguém viu.

sexta-feira, 12 de março de 2010

"O que me importa
Seu carinho agora
Se é muito tarde
Para amar você...

O que me importa
Se você me adora
Se já não há razão
Prá lhe querer...

O que me importa
Ver você sofrer assim
Se quando eu lhe quis
Você nem mesmo soube dar
Amor!...

O que me importa
Ver você chorando
Se tantas vezes
Eu chorei também...

O que me importa
Sua voz chamando
Se prá você jamais
Eu fui alguém...

O que me importa
Essa tristeza em seu olhar
Se o meu olhar tem mais
Tristezas prá chorar
Que o seu!...

O que me importa
Ver você tão triste
Se triste fui
E você nem ligou...

O que me importa
Seu carinho agora..."

[O que me importa - Marisa Monte]

quinta-feira, 11 de março de 2010

"Pertencia àquela espécie de gente que mergulha nas coisas às vezes sem saber por que, não sei se na esperança de decifrá-las ou se apenas pelo prazer de mergulhar…"
[Por Caio Fernando Abreu]

quarta-feira, 10 de março de 2010

Aprendi que quando os pensamentos começam a confundir, é hora de adormecer... Os pensamentos, a confusão, a vida ou a causa.

"Fico tão cansada às vezes, e digo pra mim mesma que está errado, que não é assim, que não é este o tempo, que não é este o lugar, que não é esta a vida. E fumo, e fico horas sem pensar absolutamente nada. Claro, é preciso julgar a si próprio com o máximo de rigidez, mas não sei se você concorda, as coisas por natureza já são tão duras para mim que não me acho no direito de endurecê-las ainda mais."
[Caio Fernando Abreu]

"Talvez um voltasse, talvez o outro fosse. Talvez um viajasse, talvez outro fugisse. Talvez trocassem cartas, telefonemas noturnos, dominicais, cristais e contas por sedex (...) talvez ficassem curados, ao mesmo tempo ou não. Talvez algum partisse, outro ficasse. Talvez um perdesse peso, o outro ficasse cego. Talvez não se vissem nunca mais, com olhos daqui pelo menos, talvez enlouquecessem de amor e mudassem um para a cidade do outro, ou viajassem junto para Paris (...) talvez um se matasse, o outro negativasse. Seqüestrados por um OVNI, mortos por bala perdida, quem sabe. Talvez tudo, talvez nada."

[Caio Fernando Abreu]

sexta-feira, 5 de março de 2010

SEMIÓTICA DO AVESSO

Às vezes me ponho a observar coisas esmas que cruzam minha rotina. Passagens e costumes que nem chegariam a configurar minha percepção.

Estava lendo sobre João Cabral de Melo Neto, uma figura literária da qual o mundo eu ainda começo a adentrar. Ele se apegava ao concretismo em busca de equilibrar sua instabilidade emocional. Isso fez um sentido imenso para mim e me identifiquei.

Todos nós temos cascas e isso não torna ninguém mais impuro. Faz parte da identidade, há sempre uma coisa atrás da outra em nossa personalidade - e não estou falando de máscaras. Estou falando de ser "o avesso do avesso do avesso do avesso".

Acho ótimo poder constatar esse tipo de coisa. É uma forma de ganhar densidade na vida, aprender sobre si mesmo e compreender melhor os outros.

Meu quarto sou eu. Cheguei a essa conclusão após uma espécie de análise semiótica sobre ele.

Guardo muito coisa nele, mesmo. Mas sempre e cada vez mais me ocupo de dispensar o que não faz mais sentido. Ainda assim, é excessivo e nunca deixará de ser.

Cada coisa tem seu devido lugar, o que lhe dá um aspecto organizado, e o mantenho assim. Entretanto, ha muita coisa inacabada. Se algo em mim me atrapalha na vida é a procrastinação.

Por exemplo, não tardei em retirar algumas fotos que não faziam mais sentido de meu "móbile fotográfico", mas até hoje não me dei o trabalho de colocar novas imagens. Assim como as contas pagas que não foram parar na pasta, os bloquinhos de anotações que não foram para o lixo e as revistas sem coleção que não se juntaram às outras solitárias em sua respectiva prateleira.

Minha alma é assim, mas o avesso do avesso do avesso do avesso disso.
O inacabado tem uma áurea eterna.

"Eu me lembro
de você ter falado
Alguma coisa sobre mim
E logo hoje, tudo isso vem à tona
E me parece cair como uma luva
Agora, num dia em que eu choro
Eu tô chovendo muito mais do que lá fora
Lá fora é só água caindo
Enquanto aqui dentro, cai a chuva

E quanto ao que você me disse
Eu me lembro sorrindo
Vendo você tão séria
Tentar me enquadrar, se sou isso
Ou se sou aquilo
E acabar indignada, me achando totalmente impossível
E talvez seja apenas isso:
Chovendo por dentro
Impossível por fora

Eu me lembro de você descontrolada
Tentando se explicar
Como é que a gente pode ser tanta coisa indefinível
Tanta coisa diferente
Sem saber que a beleza de tudo
É a certeza de nada
E que o talvez torne a vida um pouco mais atraente

E talvez, a chuva, o cinza,
O medo, a vida, sejam como eu
Ou talvez , porque você esteja de repente,
Assistindo muita televisão

E como um deus que não se vence nunca
O seu olhar não consegue perceber
Como uma chuva, uma tristeza, podem ser uma beleza
E o frio, uma delicada forma
De calor"
[Lobão]

quarta-feira, 3 de março de 2010

"O que a memória ama
fica eterno. Te amo com a memória, imperecível".
[Adélia Prado]

VÃO

Nunca poderei ser em vão, passar em vão, sentir em vão, estar em vão.
Eu preciso compreender, antes que o que me reste seja um vão na alma,
um vácuo nas horas que tira o fôlego e o sentido das coisas.

Minha harmonia não suporta concessões;
Meu equilíbrio não cabe nas faltas;
Minha liberdade não se encaixa imposições.

Aprendo a adequar as coisas que posso mudar aos acontecimentos da vida, às necessidades do espírito.

Minha felicidade não tem regras.

"Não discuto com o destino
o que pintar eu assino". (Paulo Leminski)

SOLTAR

Verbalizar?
Não, prefiro ficar com os sorrisos
discretos, descarados, desavergonhados
sentir sair os risos por entre os dentes
no intervalo de macias mordidas.
Eu prefiro acontecer
e conhecer
e passar e ir
e só ser
quase sem querer
mas gostando