BALANÇO
[Oswaldo Montenegro]
"Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...
Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...
E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...
E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.
Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!
E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas..."
"Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto".
Hoje acordei radical.
Não quero uma cerveja, quero todas!!
Desejo minhas dezenas de amigos ao mesmo tempo
e todos os sentimentos numa só dose.
Hoje não me venham com minúcias,
mesquinharias, conta-gotas
só quero enchentes,
avalanches de tudo
cada espaço preenchido.
Se couber o silêncio,
que seja denso,
pesado, tenso
insuportavelmente inebriador...
Não me venham com metades,
"abraços curtos para não sufocar"...
Quero perder o ar
depois aspirá-lo
até sentir o limite dos pulmões.
Não quero medir palavras
nem "a altura do tombo".
Quero tudo, sem medida.
A medida é ela toda.
"Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilo e medo, ponha a saia mais leve, aquela de chita e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções deesperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela.
Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria. Se você não tem namorado porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida passar e de repente parecer que tudo faz sentido:
Enlou-cresça."
[Carlos Drummond de Andrade]
Idéias lisérgicas para não deixar a vida endurecer.
"Será o estresse que desce nas veias dos corações
Ou é uma prece que tece a teia de novas paixões
Das bandeiras perdidas
Rasgadas nos mastros das religiões
Que são guardiões da culpa, da dor!"
[Zé Ramalho]
Vivo dias inversos,
um tempo vermelho,
a vida em negativo...
Mas a luz é a mesma
e a grafia também.
Sei o tempo e sua falta...
O instante decisivo que guarda e me revela a vida RUBRA
- o negativo daquela, contrastante, e tão minha quanto.
"Um dia uma pessoa me falou que a minha falta de malicia era o negativo de uma mesma foto, avesso esperto da malandragem que se manifestava naturalmente difícil. Ele disse que sou confusa,mas sou clara. E é por isso que eu cheguei inteira até aqui. Justamente eu que não sei mentir direito."
Ando promovendo o desapego em minha vida... Desapego do que não faz mais sentido.
Mas, de tudo, o mais difícil de se livrar são os sentimentos, por mais que eles sejam indesejáveis. No entanto, persisto e alcanço sempre um pouco mais... ou um pouco menos...
Tá difícil... Mas aprendo
e reaprendo!!!
O que me faz continuar...
Os instantes de prazer durante a dificuldade
e depois
o ritmo quente nos ouvidos
o deleite na nova literatura
o vento rápido que descabela
a Lua enorme e amarela no céu estrelado
a voz amiga
e a amada
a cor viva da plantinha
o morango, a azeitona e o milho...
A água gelada!
Ah! Deliciosa inquietação da desordem da vida...
É assim: A beleza me move.
Fechar os olhos para ela é suicídio.
To cansada do sofrimento gratuito do mundo,
de suas pessoas pedantes, inescrupulosas, arrogantes...
Que asco!
Incompreendo o silêncio da submissão dos que me cercam e me pergunto até que ponto me submeto... Se me submeto.
Estou farta!
Farta desta agonia que paira por perto e da iminência alheia constante do descontrole.
Me pergunto onde posso me encaixar para conviver sem danos com toda esta moléstia...
Na verdade, questiono, principalmente, se há de fato por todo o percurso hierárquico um espaço limpo, livre, são...
E tenho medo.
Temo que ao desenvolver um estômago forte demais para encarar sobriamente a cólera, adquira também uma insensibilidade, apatia e o que há de pior: uma cômoda aceitação do que é mau e injusto.
Não sei...
Não sei se posso com o que não é verdade.
E, mais cedo ou mais tarde, é provável que eu mande tudo abaixo!
Eu espero
às 12:45 AM sentido por Marina Bártholo 18 vagaram
"Uma poesia ártica,
claro, é isso que eu desejo.
Uma prática pálida,
três versos de gelo.
Uma frase-superfície
onde vida-frase alguma
não seja mais possível.
Frase, não, Nenhuma.
Uma lira nula,
reduzida ao puro mínimo,
um piscar do espírito,
a única coisa única.
Mas falo. E, ao falar, provoco
nuvens de equívocos
(ou enxame de monólogos?)
Sim, inverno, estamos vivos."
[Paulo Leminski]
Deixa o vento passar
e o sol bater
Deixa a luz entrar
pra dentro do ser
Ilumina a alma
Estanca o prazer
na face dourada
até entardecer
Passou o mês, chegou a primavera, vai acabar a semana, e nenhuma luz literalmente poética me veio.
Por outro lado, tenho andado sob a sombra praticamente poética, que gera uma confortável comunicação entre o mundo e eu. É uma convivência leve, sincera, simples e direta de uma forma que não choca, mas harmoniza.
No entanto, a palavra escrita, quando falta, cria um buraco nos meus sentidos... e na alma.
Por isso o resgate necessário.
E pelo resgate as palavras vêm... mesmo meio tortas e meio rimadas.
"Se deus quiser um dia acabo voando
tão banal, assim como um pardal, meio de contrabando
desviar de estilingue, deixar que me xingue
e tomar banho de sol, banho de sol, banho de sol, banho de sol
Se deus quiser um dia eu viro semente
e quando a chuva molhar o jardim, ah, eu fico contente
e na primavera vou brotar na terra
e tomar banho de sol, banho de sol, banho de sol, sol"
[Rita Lee]
Holded for songs.
"Grande amante do sol da manhã
Que me faz espreguiçar
Nos braços de Morfeu
Mais um dia a menos
Menos um sonho a mais
Tanto faz
Ah, como tanto fez
Deixe que eu viva em lúcida embriaguez
Deixe que eu passe por momentos de prazer
Mesmo que eu fique
Esperando por alguém"
"Perto do fogo
Eu queria ficar perto do fogo
No umbigo do furacão
E no peito um gavião
No coração da cidade
Defendendo a liberdade
Eu quero ser uma flor
Nos teus cabelos de fogo
Quero estar perto do poder
Eu quero estar perto do fogo
Perto do fogo, meu amor..."
Incrível como esse tempo de "de repências" ainda me choca, fascina.
O tempo voa e as coisas acontecem e desacontecem a cada suspiro...
Chego à conclusão que são nessas "de repências" da vida entre suspiros que me torno.
Transformo-me no que amo e no que deixo.
Cicatrizo a pele que ficou e largo esquecidos no caminho passado os fragmentos da pele seca e sem vida que, penosa e vagarozamente, desgrudou.
Mas o importante é o que fica. E o que há é uma novidade sensível... mais reluzente e ardente.
"Amor, meu grande amor
Não chegue na hora marcada
Assim como as canções
Como as paixões
E as palavras...
Me veja nos seus olhos
Na minha cara lavada
Me venha sem saber
Se sou fogo
Ou se sou água...
Amor, meu grande amor
Me chegue assim
Bem de repente
Sem nome ou sobrenome
Sem sentir
O que não sente...
Pois tudo o que ofereço
É, meu calor, meu endereço
A vida do teu filho
Desde o fim, até o começo...
Amor, meu grande amor
Só dure o tempo que mereça
E quando me quiser
Que seja de qualquer maneira...
Enquanto me tiver
Que eu seja
O último e o primeiro
E quando eu te encontrar
Meu grande amor
Me reconheça..."
Em tempos de água fria
o desejo trinca
a monotonia acorda
Em tempos de água fria
o calor escorre
o azul vibra
Eu nasço
tremendo
Em tempos de água fria.
O cuidado é pouco;
O choque é muito;
O medo é de se molhar.
"No one seems to care You're tryin' to find your way again You're tryin' to find some new... "
"Não quero o que a cabeça pensa, eu quero o que a alma deseja
Arco-íris, anjo rebelde, eu quero o corpo.
Mas quando você me amar, me abrace e me beije bem devagar
Que é para eu ter tempo, tempo de me apaixonar
Tempo para a turma do outro bairro, ver e saber que eu te amo.
Meu bem, mas quando a vida nos violentar
Falaremos para a vida: "Vida, pisa devagar
Meu coração cuidado é frágil
Meu coração é como vidro, como um beijo de novela"
Meu bem, talvez você possa compreender a minha solidão
O meu som, e a minha fúria e essa pressa de viver
E esse jeito de deixar sempre de lado a certeza
E arriscar tudo de novo com paixão
Andar caminho errado pela simples alegria de ser
Meu bem, vem viver comigo, vem correr perigo"
"Ando tão à flor da pele
Meu desejo se confunde
Com a vontade de não ser
Ando tão à flor da pele
Que a minha pele
Tem o fogo
Do juízo final...
Barco sem porto
Sem rumo, sem vela
Cavalo sem sela
Bicho solto
Um cão sem dono
Um menino, um bandido
Às vezes me preservo
Noutras, suicido!"
Primeiro o beijo,
depois do prazer, a paixão, a fumaça.
Tudo junto, um novo azul.
Rebuliços alegres e serenos,
um novo lugar...
Novos lugares, aventura, desordem...
E tudo cresce,
se move, transforma, forma e deforma.
Fluidos de liberdade...
Vou em conjunto,
flutuando nessa imensa multitonia azul
chamada vida.
São umas mãos de toques adiados.
Uns braços de abraços de força evitada.
Um conjunto de hesitações que chegam atrasadas.
Não sei se sobra ou falta...
Mas liberta.
Tenho orgulho da mulher.
Da mulher motociclista entregadora de pizza... Com capacete rosa e batom.
Da mulher mãe que num braço carrega o filho, no outro sacolas e se equlibra no ônibus para passar pela roleta com tudo junto.
Da mulher varredora de rua que acorda às 3h30 da manhã para varrer quilômetros de rua com vassouras enormes para mais tarde passar por elas com suas unhas pintadas.
Da mulher motorista de ônibus que dá bom dia e espera os idosos e as mulheres-mães sentarem antes de dar partida.
Da mulher fotógrafa que carrega uma tonelada de equipamentos e se mescla a uma centena de fotógrafos atrás de suas lentes.
Tenho orgulho da mulher.
Lá no cantinho do travesseiro ainda tinha um pouco dele.
Tinha.
Três ou quatro aspirações o levaram para o mesmo lugar intocável onde está todo o resto.
Ela procura vestígios,
restos de sua presença...
Passa o olhar pelas paredes, arestas, desníveis...
Insistentemente...
IN SIS TEN TE MEN TE
NADA
palpável, visível...
NADA
além da presença PLENA
das saudades deixadas das horas passadas à sua sombra.
"Eu tenho mania de deixar tudo para depois...
Depois a contagem das cartas a responder...
Depois a arrumação das coisas...
Despois, Adalgisa... Ah,
Me lembrar mais uma vez de romper definitivamente com Adalgisa!
Depois, tanta, tanta coisa...
Depois o testamento as últimas vontades a morte.
Só porque vai deixando tudo para depois
É que Deus é eterno
E o mundo incompleto
Inquieto...
Só é verdadeiramente vida a que tem um inquieto depois!"
[O deixador, Mário Quintana]
Agora...
O que dizer?
Frases loucas, memória,
Um passo, trajetória,
Um amor, alguma história?
O que há?
Ilusões desfeitas,
Areia de mar,
arte sem par?
Redemoinho
de pensar.
Labirinto de sentimentos
tormentos de navegar.
A dança do universo
disperso
conforme
a mudança do vento,
ao som dos carros
a dezenas de quilômetros por hora.
Eu, que horas?
Em que tempo?
Alguma coisa
queria ser dita
e se perdeu
na via
levada pela velocidade das dezenas de quilômetros por hora dos carros que cortam meu tempo.
Nem tudo é ócio, tédio, e o amarelo não faz tanto parte assim de meu coração.
O marasmo não sobrevive à paixão.
Essas palavras eu já buscava há tempos e caíram em minhas mãos na hora certa. No momento em que o presente se desfez frente a meus olhos, esta citação me forneceu a idéia da possibilidade de um novo horizonte e a certeza de que, desta vez, eu deveria fazê-lo surgir resultado de minhas próprias escolhas. Cabe a mim revelar sua amplitude.